Tramas mirabolantes cheias de reviravoltas e muitas explicações complexas. Jogar videogame hoje não é mais uma experiência ligada apenas a coordenação motora e padrões que se repetem. Estar no comando de um joystick, hoje, é ter controle sobre uma ou mais vidas, com histórias que (geralmente) tomam rumos imprevisíveis, mais ou menos como em um bom filme. E isso não para por aqui, se analisarmos a fundo a história dos jogos eletrônicos.
Ontem
No começo de tudo, ou um pouco ainda depois disso, os jogos eletrônicos estavam ligados apenas ao entretenimento instantâneo, em uma experiência fechada e única, sem nenhum roteiro ou motivação: você tem uma nave e está no espaço, destrói tudo e ganha pontos. Não havia, sequer, um fim. O objetivo era bater o recorde de pontos da máquina e só.

Uns anos mais tarde chegou aquela empresa japonesa que todos conhecemos e redefiniu os padrões, criando jogos que tinham começo e fim, ainda que o meio não fizesse lá muito sentido. Nós éramos algo e salvávamos alguém, ponto. Esquilos saltando entre caixotes, encanadores fugindo de plantas carnívoras ou irmãos gêmeos enfrentando bandidos, não importava muito: bastava seguir à direita e uma hora chegaríamos aos nossos objetivos. Com todos os clichês dos jogos da época, como fases d’água, de lava, florestas, desertos… Como se tivéssemos que dar a volta ao mundo, passando por todo tipo de cenário para atingir os nossos objetivos.

Essa etapa evolutiva, não por acaso, é a minha favorita entre todo esse amadurecimento da indústria de videogames. Esse quê de fantasia que não busca criar raízes no mundo real, tem um lado místico muito mais próximo da Literatura que do Cinema, usando e abusando da nossa imaginação para dar algum sentido às suas licenças poéticas. Afinal, se a princesa sempre está no castelo rodeado por lava, o que raios o Mario vai fazer no deserto? Por que não ir direto ao encontro dela?
Esse exercício mental aliado a ausência de um roteiro fixo conferiam aos jogos um ar bastante caricato, muito por conta da tecnologia da época que não permitia grandes exarcebações. E mesmo em um RPG, gênero famoso por contar histórias longas e com muitos personagens, era necessário um grande poder de abstração para sentir empatia por um punhado de sprites e chiptunes. A cena da ópera de Final Fantasy VI sem a sua imaginação, certamente não seria nada de mais, querido leitor.
Hoje
Ao falar com tanto saudosismo dos jogos do passado, parece que estou aqui demonizando a indústria dos jogos e seu rumo acelerado. Não é isso! Mas eu gosto de separar esses momentos tão distintos de um mesmo produto, até para fins comparativos. Um jogo de ação dos anos 90 não tem muitas semelhanças a um jogo do mesmo gênero das gerações mais novas. E não nos cabe vir aqui dizer que um ou outro é melhor, simplesmente porque não é possível comparar um e outro em pé de igualdade. São bananas e maçãs!
Essa transformação tão brusca pode ser creditada apenas ao avanço tecnológico? Imagino que não e gosto de dar nomes aos bois. Afinal, se fosse só uma questão de tecnologia, teríamos os mesmos jogos com apenas alguns apetrechos a mais, como o som digital e alguns polígonos. Versões revistas de clássicos do passado, como foi de fato o começo da moda poligonal: Virtua Racing, Virtua Fighter, nada mais que repaginações do que já havia sido feito no passado. E aí veio Hideo Kojima, com seu brilhantismo habitual e reescreveu os rumos da indústria com a facilidade que nós apertamos os botões dos nossos joysticks, promovendo um salto gigantesco entre a brincadeira de criança e o negócio bilionário. Diretamente? Não. Sozinho? Não. Metal Gear Solid não é fruto do trabalho de um homem só, além de não ter sido o primeiro jogo tridimensional do estilo. Mas provou que é possível um jogo ter um roteiro sólido (viajado, mas sólido), digno de um bom filme.

Daí pra frente, o movimento só se acentuou e hoje os principais jogos têm histórias profundas e enraizadas, com sequências, finais alternativos, com direito a um gênero especial onde somos espectadores e jogadores ao mesmo tempo, algo executado com maestria pelo pessoal da Telltale Games (de Game of Thrones, Walking Dead e outros), bebendo na fonte da saudosa LucasArts.

Amanhã
Há espaço para ambos os modelos de jogos, uma vez que a audiência hoje é tão vasta. Sem querer bater na tecla do gamer ou não (afinal, o que é ser gamer?), a verdade é que uma galera que já torceu o nariz para os jogos, hoje não passa um dia sequer sem seu angry-birds-candy-crush-fruit-ninja da vida. E movimentando bastante grana!
Em um mundo com novas redes sociais surgindo a todo momento e experiências sensoriais redefinindo a relação entre o jogador e o jogo (engatinhando, eu diria), o futuro é promissor. A ideia não é favorecer um ou outro público, mas atender a demanda e entregar conteúdo de qualidade, desde a galera do sofá que curte jogos de plataforma até o empresário apressado que só quer matar os 15 minutos de translado entre um ponto e outro da cidade.

Jogos eletrônicos não precisam, necessariamente, seguir um formato fechado e restrito. O universo é bastante vasto e tem espaço pra todo mundo, só encontrar o que mais se adequa ao seu perfil.