Tudo era parte de um grande ritual: chegar da escola às seis e meia em ponto, esticar as pernas no sofá e se desligar do mundo durante aqueles vinte e poucos minutos de duração de um episódio. No dia seguinte, a rodinha da galera na escola toda alvoroçada repercutindo cada leigun e murro na cara, com aquele entusiasmo! Ah, velhos tempos de TV Manchete…
Mesmo naquela época os jogos baseados em séries de animês eram abundantes, mas não era das tarefas mais simples achar algo sobre eles (talvez os de Dragon Ball, vai). Yu Yu Hakusho, por exemplo, teve mais de dez títulos lançados para os consoles antigos, mas poucos desses chegaram ao conhecimento do público brasileiro, sendo Yu Yu Hakusho Final (Yu Yu Hakusho: Makai Saikyou Retsuden, no original) sem dúvidas o mais famoso. Vamos recordar?
O espírito brincalhão
Tudo começa quando Yusuke Urameshi, um estudante meio revoltado com a vida, morre. Sim, ele morre logo no começo da série, abrindo espaço para o lado sobrenatural da coisa. E daí pra frente, são muitas lutas, vitórias e derrotas ao lado dos seus companheiros Kuwabara, Hiei e Kurama.
O mangá é de autoria de Yoshihiro Togashi (o mesmo de Hunter x Hunter) e foi publicado na revista Shonem Jump entre 1990 e 1994. No Brasil, o lançamento ficou a cargo da editora JBC entre 2002 e 2004, com uma versão em tankōbon (edições com 200 páginas) sendo publicada desde 2014. O animê teve 112 episódios, fora um especial e um filme. Este último, inclusive, cedeu um personagem secreto para Yuyu Hakusho Final, o chefão Yakumo.
Recentemente tivemos o lançamento de J-Stars Victory VS+ para os consoles da Sony, com a presença de Yusuke, Hiei e do não-tão-vilão-assim Toguro, mesmo vinte anos depois do lançamento da série, reforçando o seu prestígio entre os fãs de mangás e animês.
O jogo
Pancadaria pura, honesta e sem frescuras, nos mesmos moldes dos principais títulos do gênero, tão influentes na época. Tinha lá suas particularidades que nós vamos destrinchar ao longo do texto, mas o essencial estava lá.
Vale frisar que o jogo não teve localização para o ocidente, mas por se tratar de um game de luta, não havia muito o que entender além do menu de seleção de modo e das opções. Dessa forma, todas as vozes do jogo foram gravadas pelos dubladores originais da série, aumentando ainda mais a experiência do jogo.
Disputados em combates um contra um, Yu Yu Hakusho apostou em combos devastadores para criar um jogo bastante dinâmico. Além da já tradicional barra de HP, havia uma barra de reiki (energia espiritual, no português), responsável pela execução das magias e ataques especiais. Ao zerá-la, seu personagem precisava de alguns segundos para retomar o fôlego, tornando-se indefeso e alvo fácil para os combos do oponente. Dava pra recarregar o reiki a qualquer momento, mas levava-se algum tempo, além de abrir brechas para contra-ataques.
Administrar o uso da barra, por si só, já tornava o jogo um tantinho mais estratégico que os demais títulos do gênero. Para completar o pacote, havia também uma barra de stamina que ía subindo conforme o seu personagem recebia os golpes. Uma vez cheia, repetia-se o esquema da barra de reiki: seu personagem entrava em estafa e era necessário aguardar até que se recuperasse por completo.
A cereja do bolo estava no sistema de combos: praticamente todos os ataques podiam ser conectados uns aos outros, gerando uma infinidade de sequências que podiam ‘lamber’ uma barra inteira de HP sem grandes dificuldades. Um leigun disparado contra um oponente no ar poderia servir facilmente de brecha para se emendar um shotgun, ou uma voadora, ou até mesmo um especial, sempre avaliando o estado da sua barra de reiki.
Essa facilidade em desferir longos combos deixava os jogadores em total estado de alerta, já que um passo em falso era o suficiente para receber um punish irremediável.
Toda a turma está lá?
O jogo oferece 13 personagens já de cara, além de Yakumo, que deve ser desbloqueado com um código na tela de abertura. Mas se você está esperando encontrar Toguro, Jin, Touya ou Shishiwakamaru, melhor tirar o seu cavalinho da chuva. Apesar de ser a aventura definitiva do detetive espiritual no Snes, só estão disponíveis os personagens dos dois últimos arcos da série, correspondentes às sagas de Sensui e dos Três Reis Demônios. Tirando isso, todo o resto da turma está lá, com direito às versões transformadas de Yusuke (Mazoku Yusuke), Kurama (Youko Kurama) e Sensui (Battle Armor).
Há um grande equilíbrio entre todos os lutadores, sem nenhuma desvantagem absurda entre um ou outro. A velocidade de Hiei, por exemplo, é nerfada com golpes mais fracos que os poderosos socos de Raizen ou Kuwabara, claramente mais lentos.
Todos os personagens possuem golpes especiais devastadores, capazes de virar a situação de uma luta em um piscar de olhos. Alguns personagens, inclusive, conseguem se transformar durante a luta, deixando a situação ainda mais tensa para o adversário. Um dos especiais mais bacanas é o Dragão Negro das Trevas (Ensatsu Kokuryu-ha), que pode ser usado como um ataque direto ou absorvido para potencializar ainda mais os seus ataques.
O jogo oferece diversos modos de jogo, desde os tradicionais um contra um até algumas modalidades divididas em equipes, lembrando o arco do Torneio das Trevas. No modo principal você precisa escolher entre um dos quatro protagonistas, com direito a um encerramento digno ao fim das batalhas.
Aspectos técnicos
A jogabilidade é boa, mesmo que em alguns momentos a ação sofra com alguns slowdowns, mas nada comprometedor, geralmente quando tem algum golpe mais elaborado na tela. Os combos fáceis de conectar e os ataques com comandos simples, bem nos moldes de Street Fighter, fazem de Yu Yu Hakusho Final um jogo fácil de se jogar, mas difícil de se dominar por completo. E nós gostamos disso!
Os gráficos são bons, com cenários bastante trabalhados e cheios de detalhes. Cada arena remete a uma grande batalha do anime, deixando os duelos ainda mais empolgantes. Os personagens têm sprites relativamente pequenos se comparados a outros grandes jogos do gênero de luta, mas isso é só uma peculiaridade mesmo, não é algo negativo. Como as arenas são compridas, dá pra montar estratégias de combate à distância, principalmente se o seu personagem usa projéteis.
A trilha sonora empolga, mesmo sem remeter a nenhum tema clássico do animê. São músicas marcantes e bastante dramáticas, do tipo que você quer ouvir mesmo com o videogame desligado. Por sinal, deixamos algumas abaixo para vocês conferirem. Já mencionamos que as vozes são as originais do animê, mas vale a pena frisar: ouvir os gritos de “Rose Whip” e “Leigun” ajudam bastante a entrar no clima da série.
https://www.youtube.com/watch?v=nrluSRoIx3s
Outros jogos baseados em Yu Yu Hakusho foram lançados com o passar dos anos, mas nenhum chegou no grau de excelência deste aqui, unindo jogabilidade, nostalgia e timing perfeitos para cativar a legião de fãs do time Urameshi. Com essa onda de remakes nos jogos e animês, seria uma boa ver uma continuação de Yu Yu Hakusho, quem sabe com um novo torneio do Makai. Sonhar não custa nada, não é mesmo?
E é como diz o Yusuke: Não conheci o outro mundo por querer!