Desde novembro de 2015, estamos convivendo com a triste e indesejada realidade de não poder mais esperar futuros lançamentos da editora brasileira Cosac Naify, empresa da qual sou consumidora e fã incondicional. Seus livros sempre foram amados e desejados, mas pouco comprados porque seus preços são considerados altos (os títulos mais conhecidos chegavam a custar R$65, R$80, R$100…).
Para começo de conversa, quero levantar uma questão pertinente sobre esse aspecto: qual é o seu conceito, leitor, para considerar um livro caro? O preço dele, seja ele qual for, não fazer jus ao produto final ou ter que pagar mais de R$30 em qualquer livro que seja? Se a sua visão corresponde à segunda hipótese, realmente, não havia futuro lucrativo a curto prazo para uma editora como a Cosac neste país e, infelizmente, o leitor nunca compreendeu a proposta da finada editora.
Quem já parou para reparar no catálogo da editora pelo menos uma vez, vai sofrer um choque cultural ao compará-la com outras mais bem-sucedidas do mercado. A Cosac possuía um time de autores que não são apresentados aos leitores durante o período escolar – chego a pensar que nem mesmo no acadêmico -, literatura histórica que é relativamente desprezada pela nova geração de leitores brasileiras e exemplares tão bem impressos e sensíveis ao toque que matam facilmente aquela vontade de pagar mais barato pela versão e-book.
Agora, vamos juntos analisar essas características que, ao meu ver, explicam como a Cosac trabalhava, quais eram seus anseios e motivações. Antes de seu fim, os autores poderiam ter desfeito o contrato porque seus livros não vendiam aos baldes? Sim, claro. Quando a data de morte do autor completa 70 anos, suas obras nem precisam mais ter uma editora, pois entram em domínio público. Literatura clássica é importante mesmo? MUITO! Esses livros “difíceis de ler” nos contam as histórias que os autores e autoras criavam naquela época de acordo com o que tinham ao alcance das mãos e baseados nos contextos sociais, políticos e econômicos também, algo extremamente valioso e diferente do que temos capacidade de produzir hoje – e a Cosac trabalhava também com publicações atuais e inéditas.
O pulo-do-gato, na verdade, foi pensar, planejar e executar um plano de como ficaria o livro em todos os seus pormenores (fonte, tipo de folha, capa, inclusão de relevo). Isso, caro leitor, somente a Cosac Naify fazia e de uma forma muito melhor do que qualquer editora brasileira! Ao se depararem com o resultado, foi fácil e lógico deixar de publicar apenas livros de arte para ter em seu catálogo livros de humanidades também, algo mais literário.
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Durante o anúncio do encerramento de suas atividades, o dono da Cosac elencou uma série de fatores para justificar a decisão que pegou de surpresa leitores, autores, editores e até mesmo funcionários: crise econômica, dólar nas alturas, inflação descontrolada e… um desabafo: “livro já não é um produto tão popular no Brasil, infelizmente”. O que torna um livro popular?
O preço?
O conteúdo?
A capa?
O buzz gerando pelo marketing?
Um filme baseado nele?
Todos as alternativas?
Elementar, meu caro leitor. Cada sociedade terá um motivo para tornar popular determinado título. Esta na qual estamos não estava indo de encontro com o que a Cosac Naify preparava: livros que não são feitos apenas para serem lidos. Todos os componentes possíveis que um livro pode apresentar eram pensados para dar brilho e função para o conteúdo e seu autor(a). É por isso que um livro da Cosac Naify valia o quanto lhe era determinado a custar. Mas também é por isso que a editora teve que fechar as portas.
Tudo isso não impedia que o leitor se jogasse na busca incessante pelo melhor preço só para pagar um pouco mais barato por exemplares novos da Cosac. Essa era uma missão árdua e trazia resultados a médio prazo. Nem mesmo a maior rede de sebos do Brasil, a Estante Virtual, trazia opções muito abaixo do que o preço oficial de tabela. Só que esse momento único e empolgante acabou a partir do momento em que a venda de todo o estoque foi concentrada no excelente site da Amazon. Como o o custo-benefício sempre valeu a pena, não vi problema quanto a isso.
Em vista de um fim eminente do estoque, o que nos resta? Comprar o que ainda estiver disponível. E depois? Cuidar dos exemplares que temos e torcer para que a Cosac Naify inspire novas editoras que ainda não estão prontas para serem lançadas no mercado. Desde que comecei a ler aos 6 anos, venho de uma educação contínua que prega o seguinte: cada livro é uma porta para um mundo que só existe em si mesmo. Tudo o que a Cosac fez foi me apresentar mundos mais palpáveis, coloridos, consistentes e lúdicos. Quem vai ficar com esse papel tão importante para esta geração e para todas futuras gerações de leitores que estão vagarosamente sendo construídas?